segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O QUINTO PECADO DO GOVERNO: AFOGAMENTO DA NOSSA CULTURA

Chegou a vez de falarmos do quinto pecado: o afogamento da nossa cultura. Com Governos normais, este pecado nunca seria incluído na lista dos sete pecados. Cabo Verde pode-se orgulhar da sua rica e vasta cultura. Para além das nossas lindissimas praias, podemos oferecer aos nossos visitantes o nosso património cultural. Seria desnecessário, solicitar, à qualquer Ministro da Cultura o cumprimento dos desígnios constitucionais nesta matéria, pois, o que temos de mais valioso, é a nossa cultura. Até neste ponto, onde não se pode falhar, falhou o Governo.

Assim sendo, como pode então o Governo falar em novos tempos, novas respostas e apresentar novas propostas? Esta é a hora do balanço do trabalho feito. Estando no final do mandato, é altura de apresentar contas ao país, porém, como o saldo é, claramente, negativo, o Governo pretende ludibriar os cabo-verdianos falando em propostas e fugir ao balanço. Bela estratégia!

Por todas estas razões, e por muitas outras que outros cidadãos poderão enumerar, vale a pena continuar a falar dos sete pecados e de tudo o que nos causa indignação. Falemos então do quinto pecado: o afogamento da nossa cultura. Acredito que nada nos toca mais profundamente do que a nossa cultura! Nada nos causa mais emoção e, tem sido motivo de orgulho ao povo cabo-verdiano. A nossa identidade cultural é a nossa alma, é aquilo que constitui, a Nação cabo-verdiana. Antes de sermos um Estado já erámos uma Nação, pois, a Nação é um conceito que está relacionado com a nossa cultura, a nossa língua, os nossos costumes e tradições.

Perder a nossa cultura é perder, de uma certa forma, a nossa identidade, o nosso orgulho, o nosso ego. Os cabo-verdianos estão espalhados pelos quatro cantos do mundo, vivendo em realidades, culturas e diria até em mundos diferentes. Contudo, o que nos une são precisamente os laços culturais. Sentimo-nos felizes quando, em terras estranhas, nos cruzamos com um cabo-verdiano pois, o laço cultural é como o laço de sangue, não se lava, não se perde e sente-se com fervor.

Pela importância da cultura, por ser a nossa identidade, por ser aquilo que faz de nós uma nação, temos de a preservar, incentivar e fomentar actividades que a promovam e a enriqueçam. Assim, valorizemos os nossos artistas pois são um dos veículos da nossa cultura. Têm, por exemplo, levado voz, o som, os gostos, os versos de Cabo Verde por este mundo fora.

Tal como noutros pecados, não posso deixar de fazer referência à nossa Constituição, a nossa lei fundamental e frisar, o que diz a Constituição sobre esta matéria.

Com efeito, entre as funções do Estado (Artigo 7.º), e no tange à cultura, frisemos os seguintes:
(i) Defender a independência, garantir a unidade, preservar, valorizar e promover a identidade da nação cabo-verdiana, favorecendo a criação das condições sociais, culturais, económicas e políticas necessárias;
(ii) Preservar, valorizar e promover a língua materna e a cultura cabo-verdianas;

O direito à cultura está consagrado no artigo 78.º. para garantir este direito, incumbe ao Estado, nomeadamente:
(i) Apoiar iniciativas que estimulem a criação individual e colectiva e a circulação de obras e bens culturais de qualidade;
(ii) Promover a participação dos emigrantes na vida cultural do país e a difusão e valorização da cultura nacional no seio das comunidades cabo-verdianas emigradas;
(iii) Incentivar e apoiar as organizações de promoção cultural e as indústrias ligadas à cultura.

Infelizmente, nenhuma destas incumbências foram levadas a cabo pelo Estado, pelo nosso Ministro da Cultura - mais uma clara violação da Constituição.

É certo que a nossa herança cultural é o nosso tesouro. Todos os políticos reconhecem a veracidade desta afirmação e empolgam-se em discursos em prol da nossa cultura. Felizmente a nossa cultura é uma árvore que brota naturalmente, vai dando frutos mesmo sem chuva ou sem ser regada. A cultura é um tesouro inesgotável, um osso duro de roer, que se perpetua no tempo... Por sermos um país de artistas, de talentos, de cultura, cada dia descobre-se um novo talento, um novo embaixador de Cabo Verde.

Contudo, acredito que se tivessemos um Ministro da Cultura mais amigo e mais preocupado com a nossa cultura estaríamos num patamar mais elavado. Várias vezes, ouvi e li artistas a pedir a demissão do Ministro da Cultura, inúmeras vezes li e ouvi que o nosso Ministro de Cultura é o ministro do crioulo e não da cultura. Muitas vezes li e ouvi artistas reclamando que a nossa cultura ficou esquecida por este Governo. Visto que é opinião, quase unanime, diria que este Governo prestou uma péssimo serviço à cultura cabo-verdiana, melhor... não prestou serviço algum.

Continuamos sem infra-estruturas na área da cultura e os que existem, alguns não funcionam. Como explicar a paralisazação do palácio da cultura Ildo Lobo? Como escreveu um artista, “O Palácio da Cultura Ildo Lobo é a materialização da estupidez cultural que vivemos nos dias presentes”.

Sobre o Ministro da Cultura escreve o mesmo artista” ... não se percebe como pretende dirigir um sector tão complexo e exigente se não comparece a nenhum dos melhores eventos da cidade!” e num tom de desabafo ou indignação aos novos tempos, novas propostas, novos desafios de José Maria Neves, acrescenta o ilustre artista que, “o desafio da Cultura nem se pôs”.
É apenas um exemplo ilustrativo da inércia, da tentativa de afogamento e destruição da nossa cultura. O que fez (melhor, o que não fez) o Ministro da Cultura é uma tentativa cruel de destruição da nossa cultura, da nossa identidade. Por isso, não nos causa estranheza, a indignação de muitos artistas.

Para tentar salvar o barco, o Ministro da Cultura, resolve apostar na oficialização do crioulo e fazer deste facto a bandeira do seu ministério. Contudo, mesmo neste ponto enganou os cabo-verdianos, todos sabiam, inclusive o Ministro, que oficializar o crioulo exige um longo trabalho e não podia cair de para-quedas. Como defendeu o Doutor Corsino Tolentino, numa entrevista concedida ao jornal expresso das ilhas: “..além de promessa eleitoral sem devido suporte científico e técnico, pretendeu-se fazer avaliação voluntarista do ALUPEC...o processo parece viciado e é contra este modo de agir que muita gente estará...a mão invisível ou a conspiração não existem, mas coisa diferente, a sociedade exige rigor e verdade, porque qualquer das línguasn nacionais é assunto demasiadamente sério para ser deixado exclusivamente aos linguistas profissionais ou amadores...”

Até ao próximo pecado: diáspora esquecida!

Sem comentários:

Enviar um comentário